A Noção de Cultura nas Ciencias Sociais, por Denys Cuche.






Cuche, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais/ Danys Cuche; tradução de Viviane Ribeiro, 2 ed. Bauru: EDUSC, 2002.

·         Gênese social da palavra e da idéia de cultura

 A palavra cultura nasce no berço na sociedade ocidental européia com um sentido amplo a ponto de não ser deliberado o seu conceito, pois a palavra se aplicar as mais diversas situações.

Na França da idade média ao século XIX, a palavra cultura estava ligada ao cultivo do campo, posteriormente em sentido figurado foi ligada a capacidade de desenvolver uma habilidade, tal como um faculdade antes adormecida que agora passará a ser formado. Todavia ainda nesse sentido emblemático a palavra cultura passou a ter seu termo empregado sempre com um complementar afirmando o que estaria a ser desenvolvido, como exemplo: a cultura das letras, das artes ou ate mesmo a cultura das ciências. Mas logo passou a ser utilizado sem complementareis simbolizando a formação, educação do espírito.

Com tudo no século XVIII, no Dicionário da Academia, edição de 1798, a palavra cultura ganha os ares ação de instruir ao saber, inaugurando o estagio antes nunca visto de oposição entre a “natureza” e “cultura”, pois para os Iluministas a cultura se tratava de:

“[...] A soma dos saberes acumulados e transmitidos pela humanidade, considerando como totalidade, ao longo de sua história.”
                                                                                                       (Cuche, p. 21)


No século XVIII o termo “Cultura”, logo foi absolvido pelas reflexões iluminista que se pautava no universalismo e humanismo, a palavra cultura foi associada às idéias progressistas, evolucionarias e educativas da razão.

Segundo Cuche: “A idéia cultura participa do otimismo do momento, baseado na confiança no futuro perfeito do ser humano. O progresso nasce da instrução, isto é, da cultura cada vez mais abrangente” (2002, p. 21)

 Cultura e civilização, palavras pertencentes do mesmo campo semântico, diferentes, mas muitas vezes associadas. Até o momento a concepção francesa de cultura esta atrelada principalmente ao progresso individual, já civilização aparece apenas no século XVIII, sendo sucinta ao progresso coletivo e flexionado ao desenvolvimento dos costumes. Interpretado pelos iluministas como o processo que tira a humanidade da ignorância e irracionalidade.

Ambos os termos estão em suma tão interligados a idéia de progresso que permite o surgimento de outra ideologia desligada da história, a filosofia se despende da teologia o que marca uma nova era de esperança religiosa e uma nova visão do Homem. Em 1787, Alexandre de Chavannes cria o termo Etnologia, defino o como a disciplina que estuda a história dos progressos dos povos em direção à civilização.

No contexto alemão, uma visão contraria a francesa é criada referente tanto a cultura quanto a civilização. Na Alemanha o termo “Kulter” é criando no XVIII e se apresenta como um copia fiel da concepção francesa de cultura, todavia desenvolve se e ganha traços mais restrito e opositor ao termo civilização.

Segundo Norbert Elias essa característica só foi criada pela diferente a realidade da Alemanha a forma de organização política e social da França, que era tomada em escala de evolutiva como mais desenvolvida, possibilitando sua imitação pela corte alemã, o que gerou criticas, principalmente pela burguesia que vão se opuseram a essa reprodução que deixava de desenvolver suas próprias bases artísticas e literárias. Visão germânica retrata a cultura como tudo o que é autêntico e que contribui para o enriquecimento intelectual e espiritual, e que apenas o que é aparência brilhante, leviandade, refinamento superficial seria pertence à civilização. 

A reabilitação da Alemanha, cultura antes apenas observado na burguesia intelectual no século XIX passa a ser um sentimento nacional, as marcas dessa cultura como a sinceridade, a profundidade e a espiritualidade agora são tomadas como formas exclusivas da consciência nacional alemã de glorificar sua cultura frente ao poder de Estados vizinhos. Sendo assim, a noção de kulter intensifica-se nas particularidades nacionais opondo-se à noção francesa universalista de civilização. 

No ano de 1774, Johann Gottfried Herder colaborava com a diversidade cultural com pretexto de devolver aos povos seus respectivos orgulhos nacionais, começando pela Alemanha.

“Para Herder, na realidade, cada povo, através de sua cultura própria, tem um destino especifico a realizar. Pois cada cultura exprime à sua maneira um aspecto da humanidade” (Cuche, p.27)

A idéia de cultura na Alemanha não se modificou no século XIX, mas com a forte influência do nacionalismo, se acoplou ao conceito de nação, contudo nas conquistas do espírito não estive ligada as realizações técnicas referentes ao progresso industrial, o ideal alemã de a cultura- kulter se manteve como expressão da própria alma de um povo. Essa particularidade apenas encontrada na Alemanha se adequou ao conceito de étnico- racial de nação como comunidade de indivíduos da mesma origem. Na França, desenvolveram-se ainda mais a dimensão coletiva, deixando um pouco de lado a vertente do ampliar o saber intelectual dos indivíduos. Porém, o conceito francês dominante ainda se refere a idéia de unidade do gênero humano.

A disputa dual pela hegemonia do conceito de cultura tanto na França quanto na Alemanha, como uma particularista versus uma concepção universalista, desde o século XVIII ao XX, apontam como as principais bases de definição de cultura e as primeiras dificuldades de se chegar a um consenso conceitual de cultura nas ciências sociais.

·         A Invenção do conceito científico de cultura 

Diante da disputa pela acepção do termo cultura na Europa ocidental, ainda no século XIX foi instaurada a reflexão positiva sobre o homem e sociedade, as buscas de cientificidade nessas questões marcaram o nascimento da etnologia e sociologia. Ambas designadas à obtenção de respostas, a etnologia almejava responder as questões da diversidade humana, peculiaridades e costumes. Para isso, dois caminhos fora criados: 1) Um que observa a unidade, restringindo a diversidade a um fator temporal, ou seja, por um esquema evolucionista; 2) Modificando o jeito de olhar o outro, colocando a diversidade como fator central.

Concepção de cultura segundo Edward B. Tylor:

“Cultura e civilização, tomadas em seu sentido etnológico mais vasto, são um conjunto complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, o direito, os costumes e as outras capacidades ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro da sociedade” [1832, p.1] 

Para Tylor, essa definição de cultura ganha à característica neutra, o que permite analisar a humanidade rompendo com a abordagem primitiva, unindo uma concepção evolucionista e universalista, ele é o responsável pelo reconhecimento da Antropologia como disciplina universitário, considerado o fundador da antropologia britânica.

Entretanto um novo método se desenvolve, a Etnologia surge com Franz Boas afastando-se cada vez mais da visão evolucionista de Tylor, para Boas a diferença entre os grupos humanos é de ordem cultural, buscando desconstruir o pensamento a noção de raça, mais e menos desenvolvidas. Além de desenvolver um método anti-etnocêntrico, que posteriormente ficou conhecido como relativismo cultural. 

“Um costume particular só pode ser explicado se relacionado ao seu contexto cultural.” (Cuche, p. 45)

No cenário francês a etnologia esteve muito subsidiada como uma ramificação da sociologia, ganhando espaço apenas durante os anos trinta, em que adquiriu sua autonomia construindo seus próprios instrumentos conceituais.

Com Durkeim a cultura foi tomada por uma postura relativista, a qual se referia em suma, a sua visão concepção geral de sociedade e normalidade social, buscando delimitar a natureza junto ao social. Já com Levy-Bruhl, a cultura ganhou um aspecto diferente da concepção unitária utilizado por Durkeim, Levy-Bruhl lutava contra as teorias evolucionistas, de progresso mental.

·         O Triunfo do conceito de cultura

A consolidação do termo cultura aconteceu de diferentes formas em diversos países dentro dos seus respectivos quadros contextos sociais. Nos EUA, a concepção de cultura desenvolveu-se sobe o mito nacional de formação de um país de imigrantes, no qual se era permitia a formação ou continuação de comunidades étnicas particulares, com as transformações regidas pelo novo ambiente social é questão. A antropologia americana é separada em três grandes vertentes: 

1. Sobe influencias de Boas, com bases na história cultural. 

Retomando as pesquisas sobre a dimensão histórica dos fenômenos culturas, seus principais representantes são Franz Boas, Alfred Kroeber e Clark Wissler, contribuindo a antropologia americana o conceito de modelo cultural, que institui a estrutura pela qual uma cultura se integra a seu meio ambiente, alem inaugurarem uma nova perspectiva de pesquisa quanto à aculturação e as trocas de culturas. 

2. Dedicada a explicação sobre as relações entre a coletividade e individualidade.

A análise funcionalista tem como seu principal pensador Bronislaw Malinowski e como sua principal contribuição, o método etnográfico, denominado de observação participante, em que o pesquisador partilha a vida no meio estudado para fugir do etnocentrismo. Alem de propor que o objeto de estudo da antropologia é o estudo das instituições. 

3. Que analisa a cultura como um sistema de comunicação entre os indivíduos.

Um grupo de antropólogos buscou explicar a relação dos indivíduos com a cultura, da forma em que ela se apropria deles e influenciada por ele. Para, eles não existe cultura em si fora da relação com os indivíduos.

Ruth Benedict propôs que a cultura é a caracterização por orientações e escolhas, sabe a perspectiva de sua hipótese das possibilidades de cultura dispostas moldando um arco cultura em que as culturas são definidas por tipos ou estilos, ela indica que cada cultura é constituída por sei pattern, ou seja, pela configuração de um estilo ou modelo, simbolizando o ideal de homogênea e coerente.

Segundo Ruth:

“O que define então uma cultura, não é a presença ou ausência de tal traço ou complexo de traços culturais, mas sua orientação global em direção, “seu pattern mais ou menos coerente de pensamento e ação”” [Benedict, 1934. (grifo do autor)] 

Já Margaret Maed, moldou seu ponto de vista em saber como os uns indivíduos recebe sua cultura e o resultado dela em sua personalidade concentrando-se no processo de transmissão cultural e socialização da personalidade. Ela desconstrói o que era dito como verdade universal, que as personalidades femininas e másculas não são de ordem biológica em todas as sociedades. Ela conclui que as personalidades dos indivíduos são concretizadas a partir de seus modelos culturais e particular de cada sociedade.

A personalidade básica, segundo Ralph Linton e Abram Kardiner, essa concepção é determinada pela cultura a que o individuo esta submerso, a qual cada indivíduo adquire por meio do sistema educativo de sua sociedade, das instituições primarias e secundarias a que pode modificar sua cultura e consequentemente também modificar a sua personalidade.
No campo do debate sempre existiu um censura na antropologia cultural norte-americana, seja ela externa como as fortes críticas francesas ou internas quanto o culturalismo. Na França, Levi-Strauss foi o responsável o retomar essas perspectivas tomando alguns conceitos utilizados por Ruth Benedict, primeiro referente às diferenças culturais e seu conceito de definição por modelo. Segundo lugar, a acepção por ela usada de tipos de culturas. Em terceiro, o estudos das sociedades primitivas como método de determinar as combinações entre culturas. E por fim, a possibilidade estar às combinações nelas próprias, sem depender de fatores externos. Todavia, Levi-Strauss buscar ultrapassar a abordagem particularista das culturas e suas variações, mas também almeja estudar a invariabilidade. A antropologia estrutural de Levi-Strauss baseasse em encontrar regras universais que possa caracterizar o ponto em que a Cultura substitui a Natureza que também são os princípios indispensáveis da vida em sociedade.

O conceito de subcultura e socialização, segundo Edward Sapir, se referem as peculiaridades como grupos sociais e as classe étnicas, o outro esta atrelado ao processo de integração dos indivíduos a sociedade ou grupos particular pela interiorização dos modos de pensar, sentir e agir.

Com base nas acepções do mesmo Sapir, na década de 50 foi cria a Antropologia da comunicação que levava em consideração tanto a comunicação verbal quanto a não verbal entre os indivíduos. Para Gregory Bateson, a comunicação é resultado de um conjunto de interação, que a cultura existe apenas através da ação interação dos indivíduos, seus contextos e suas regras.

 Essa visão interacionista projeta-se entre a difusão do conceito de subcultura e cultura, pois considera a construção da cultural vinda da cultura local que uni os indivíduos em interação, considerando a cultura universal como a encontro das subculturas que funciona como culturas inteiras, ou seja, como um sistema de valores, representações e comportamentos. Para eles, o uso do termo subcultura é, portanto, corrompido em sua singularidade.

·         O estudo das relações entre as culturas e a renovação do conceito de cultura.

Como o passar dos anos as pesquisas se estenderam quanto a cultura, as múltiplas e diferentes culturas, também como quanto os contatos culturais e o processo de mudança de cultura. Pesquisadores como Melville Herskovits, discípulo de Boas, dedicou-se a investigar a culturas negras, sobre tudo o sincretismo cultural no continente americano, idealizando ainda mais os fatos de aculturação como fontes de saberes autênticas. Roger Bastide também se interessou pelo processo de aculturação, principalmente as afro-brasileiras. Bastide introduzira a França no campo das pesquisas sobre aculturação.

O conceito de aculturação segundo o Conselho de pesquisa em ciências sociais:

“A aculturação é o conjunto de fenômenos que resultam de um contato contínuo e direto entre grupos de indivíduos de culturas diferentes e que provocam mudanças nos modelos (patterns) culturas iniciais de um ou dos dois grupos” (1936, p.115)

Todavia, eles alertaram quanto a diferença entre aculturação e assimilação, na qual assimilação é colocada como ultima fase da aculturação,essa dificilmente atingida. O memorando criado por Robet Redfield, Ralph Linton e Melville Herskovits; O conselho de pesquisa em ciências sociais elaborou uma tipologia dos contatos culturais contribuindo para mostrar a complexidade dos fenômenos de aculturação.

Esses antropólogos deduziram que a aculturação não se trata de uma pura e simples conversão de uma cultura para outra, sim por uma seleção de elementos culturais emprestado, introduzindo assim a noção de tendência. 

As limitações antes já encontradas, a teoria da aculturação e o culturalismo norte-americano se assemelham com tudo em seus percalços, a questão da cultura recai como um sistema. Sendo assim, uma unidade organizada e estruturada de um todo. Desta forma, a cultura é vista como uma segunda natureza do individuo, que assim como sua natureza biológica, na qual se encontra submerso. Entretanto, mas uma vez é deixado de lado às influencias e responsabilidades sociais que beiram sobre o individuo em seus grupos.

Segundo Bastide, as relações do cultural com o social se dão nos diferentes quadros de relações sociais, favorecendo as relações de integração, de competição ou conflito. Ele também procura cria sua própria tipologia dos quadros sociais nos quais acontece aculturação, levando em consideração as mais diversas situações possíveis, pois a concepção de aculturamação é preciso considerar tanto o grupo que recebe quanto o grupo que dá. Também sugerindo os termos interpenetração ou entrecruzamento das culturas para substituí o termo aculturação. A tipologia idealizada por parte dos princípios: a) De um plano geral; b) cultural e c) do social. O resultado que encontrou das três analises foi de doze possíveis situações de âmbito dos contatos culturais, cada um com sua peculiaridade geral, aproximadamente político, com aspectos culturais e sociais próprios.
Diante de diversas reflexões sobre o processo de aculturação e contra-aculturação diferenciou-se e provocou uma renovação no conceito de cultura de até então, agora os pesquisadores partem de um pressuposto de que nenhuma cultura existe em seu estado puro, sem que jamais tenha sido influenciada externamente. A cultura passou a ser vista como um processo permanente de construção, desconstrução e reconstrução.

·         Hierarquias sociais e hierarquias Culturas

As culturas como frutos das relações sociais, assim como essas já nascem desiguais, segundo esse pensamento as hierarquias se dão são através das classes sociais, na qual se configura a cultura dominante e a dominada. Com isso, a maioria das culturas particulares apresenta-se como uma reunião de elementos originais e importados, inventados e emprestados.

·         Cultura e Identidade

A associação do termo cultura com a concepção de identidade, essa confusão surgiu a partir dos anos 70, quando a moda de identidade cultural se popularizou a de auto-afirmação e diversas ideologias surgiram por uma sociedade multicultural.


 Segundo Cuche:

“A cultura depende em grande parte de processos inconscientes. A identidade remete a uma norma de vinculação, necessariamente consciente, baseada em oposições simbólicas” [2002, p. 176]

O consenso sobre identidade cultural nas ciências sociais tornou dinâmica e fluída, que não veem a identidade independe de um contexto relacional, socialmente designada por um conjunto de conexões referentes ao gênero, a idade, classe social e nação, permitindo que o indivíduo se conheça no grupo particular ou em todo o sistema social ou na visão subjetiva, o que permitiria o indivíduo escolher arbitrariamente a identidade em que melhor se encaixa. 

No entanto, a identidade é vista como uma construção que se organiza em uma relação que opõe um grupo a outro que esteja em contato, porém a identidade trata-se de concepção que se constrói e reconstrói incessantemente devido ao contato social. Com isso a identidade é moldável, ligada a alteridade. A identificação trata-se de uma questão auto-afirmativa ou impositiva, ela está sempre no jogo da lutas sociais, entre a classificação de dominante ou dominado. 

Cunhe chega à conclusão que não há identidade cultural em si mesma, que a essa é uma construção social, restando apenas à questão contextual em que foi construída. 


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